quarta-feira, fevereiro 18, 2009

O "absoluto realismo"


Há cobranças válidas. Uma delas justifica-se por nascer com o espírito da arte. As demais são adjacentes à alma posto que há um abismo entre a realidade e a fantasia -- estas duas faces da vida. Validada a cobrança da fantasia, da imaginação, da arte da memória em criar representações, é-nos pesarosa a realidade. Dito de outro modo: quais cobranças são necessárias à realidade se à imaginação somos absolutamente livres? E ser livre é não envelhecer os sonhos.

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Dois seres que se beijam pela primeira vez. Naquele filme antigo visto há tempos; naquele dejà vu; naquele espaço expandido do quadro, propício a múltiplos sentidos; naquele firmamento da fotografia, alterado. Eles se beijam sem cobrar das cores e dos cortes do tempo e do espaço a realidade.
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Cá pelos Trópicos só há a monotonia de uma estação. Verão seco. Verão úmido. Verão chuvoso. Verão sempre. Mas o Sol nada cobra daqueles que sonham com o Inverno. As outras estações ainda inexploradas -- sem flores, sem folhas caducando nas ruas -- são contigentes na alma; alma a mudar sempre de estação.

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Só para dizer que os filmes são cobranças válidas. Há verdades neles. São verdades exploradas na imaginação. Imaginar é ver com os olhos da alma a realidade desejada. O absurdo humano é ser cobrado por quase nada; pelo que a vida soberbamente nos aplaca da paixão. Paixão é uma fada que pergunta: que deseja?

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"O 'absoluto realismo' do cinema é uma não realizada, logo potencial, magia" [S. Brakhage]

Um comentário:

Amanda Teixeira disse...

"A Arte é a vida congelada". Li isso num livro do Peter Gay, "A Paixão Terna".

Ele diz também que "as fantasias são seqüências de acontecimentos imaginários ditadas pelo desejo. Brotam dos movimentos mais profundos da mente, especialmente de suas necessidades desatendidas (...). As forças que motivam as fantasias são os desejos insatisfeitos, e toda fantasia é o atendimento a um desejo, uma correção da realidade insatisfatória".

A ficção "consiste em fantasias disciplinadas, ordenadas e embelezadas".

Se temos o direito de corrigir a realidade insatisfatória, ordená-la e embelezá-la, por que deixaríamos de fazê-lo?